segunda-feira, 23 de novembro de 2009

Adveniat - Buscai

A Bíblia insiste em nos orientar quanto a certas atitudes que os seres humanos temos o costume de esquecer: lembrai, fazei, buscai. São imperativos justamente porque tendemos a negligenciá-los em nossa vida espiritual. Jesus mesmo quando esteve aqui como Homem, alertou aos discípulos quanto a necessidade de buscarem a Deus, fazendo ecoar as palavras do profeta Isaías: “Buscai ao SENHOR enquanto se pode achar, invocai-o enquanto está perto” (Isaías 55:6; João 7:33, 34; Mateus 7:7)

Mas como o mesmo Cristo que disse “buscai e achareis”, assseverou que chegaria o momento em que seus discípulos O buscariam sem sucesso? E como entender que em dado momento Deus pode se “esconder” de nós, ir “para longe”, e por isso temos que buscá-lo agora? A mesma Bíblia não contém tantas promessas relativas à presença contínua de Deus para aqueles que O amam? Não é justamente a idéia de um Deus onipresente, com quem podemos contar sempre, que se constitui a maior segurança do cristão? Por que então o alerta para buscá-lO se Ele estará conosco perpetuamente?

Acredito que biblicamente Deus já demonstrou que sempre esteve e sempre estará a procura do Homem – este é o próprio plano de Salvação: “Porque o Filho do homem veio buscar e salvar o que se havia perdido” (Lucas 19:10). Somos nós quem nos afastamos de Deus por causa da nossa natureza pecaminosa, e por isso precisamos ser lembrados de buscá-lO. Refiro-me àquela natureza pecaminosa que nos faz cometer delitos e pecados muito maus, nos fazendo sentir indignos da face de Cristo, mas que também é a mesma natureza pecaminosa que nos faz achar que, ao praticarmos atos de bondade e justiça, não precisamos mais da presença de Deus para nos ajudar – é só cumprir as regras e estaremos salvos. As igrejas lotadas são aquelas onde alguém está pregando que você pode fazer tudo que quiser sem que haja consequências espirituais, ou onde alguém está fazendo listas de coisas que você precisa fazer para ser salvo - ambos os enganos, métodos fáceis para tapear o espírito e desviá-lo de uma busca verdadeira, mas muito mais complexa, rumo a Deus.

“Buscai ao SENHOR e a sua força; buscai a sua face continuamente” (Salmos 105:4). Força para vencer nossa tendência para o mal e para a auto-suficiência. Continuamente, porque não basta buscá-lO quando nos sentimos maus, perdidos, doentes, necessitados, arrependidos. É preciso permanecer buscando a Deus quando achamos que tudo está sob o nosso controle, quando forjamos maneiras de nos sentirmos bons e justos, quando criamos nossas próprias formas de assepsia espiritual que não passem pelo sangue do Cordeiro, quando nossos atos de justiça própria nos embriagam e viciam a ponto de não sentirmos mais necessidade nem prazer de chamar pelo nome de Deus, de nos humilharmos, orar, buscar sua face, nos convertermos dos caminhos maus que nem enxergamos mais, ouvi-lO, sentir Seu perdão, gozar Sua cura (2 Crônicas 7:14).

Somos tão miseráveis, pobres, cegos e nus que nossa natureza se deixa perverter facilmente tanto pelo que é mau quanto pelo que parece bom. E quando buscamos a Deus é sempre por necessidade, por interesse, e tem mesmo que ser assim, porque somente cônscios do quanto somos vis é que poderemos entender plenamente a grandeza e misericórdia de Cristo. “Na verdade, na verdade vos digo que me buscais, não pelos sinais que vistes, mas porque comestes do pão e vos saciastes” (João 6:26); não O buscamos porque somos bons, mas porque Ele é bom. E a justiça que encontramos ao buscá-lo está em desviarmos os olhos de qualquer bem ou mal, orgulho ou culpa que haja em nós, e contemplar a “rocha de onde fomos cortados, e a caverna do poço de onde fomos cavados” (Isaías 51:1)

Buscar a Cristo exige mais de nós que ir ao templo, que se ajoelhar ou fazer nossas leituras devocionais. Essa é uma busca para se fazer como quem procura tesouros escondidos por trás de nossa suposta sapiência (Provérbios 2:4), uma busca para se fazer com diligência de um ser humilde (Provérbios 7:15), com TODO o coração e inteireza de alma (Deuteronômio 4:29, Jeremias 29:13), com prioridade, e isso pode envolver sacrifício (Mateus 6:33), com a ansiedade genuína de um espírito sedento - sede gerada pelo próprio Espírito de Deus, e um espanto renovado a cada encontro com a Fonte da surpreendente Graça (João 4: 1 – 30).

E ainda é preciso lembrar que buscar a Deus já é se colocar na presença dEle, já é ser agraciado com a necessidade de estar com Ele, mesmo que isso nem sempre seja percebido como um presente. Essa busca não parecerá nunca estar perto de terminar. Por vezes parecerá até mesmo inútil, porque o humano que há em nós não consegue ver facilmente as evidências espirituais da presença de Deus. Portanto alem de buscá-lO, temos que compreender que a vida é a própria busca: “Buscai-me e vivei” (Amós 5:4), diz o Senhor àqueles que o procuram.