domingo, 19 de novembro de 2000

Out

“Na tua presença, Senhor, estão os meus desejos todos...” Salmo 38: 9

Depois de seis meses de turismo na “Terra da Fumaça” (título carinhoso dado a São Paulo por meu amigo Marcão), chegou enfim o dia de fazer o que realmente vim fazer aqui: a prova para tentar transferir meu curso da UFRN para a USP. Como todos os dias solenes, especiais e esperados, foi um dia completamente normal, com o sol seguindo rotineiramente sua trajetória. Eu me dirigi para o local das provas, tranquila, estando pronta a deixar a vontade de Deus me guiar e certa de que “o coração do homem pode fazer planos, mas a resposta certa vem dos lábios do Senhor” Provérbios 16:1.
Ao contrário de mim, os outros candidatos transpiravam ansiedade por todos os poros, e eu me divertia olhando o modo espantoso como o único membro deles que conseguia se mover - a boca - aliviava a tensão: os que não mastigavam quilos de guloseimas, devoravam lápis (estes em quantidade suficiente para fazer umas duas mil provas subjetivas), ou roíam avidamente as unhas, mordiam borrachas, rezavam e assobiavam, alguns fazendo tudo isso ao mesmo tempo.
Essa atmosfera bélica me fez lembrar o vestibular de 1996, meu primeiro, que prestei para Engenharia Têxtil (embora descobrisse um semestre depois da matrícula que não “prestava” para a área de exatas). A primeira prova foi no sábado, e ficou estabelecido que os adventistas ficariam confinados num local específico, desde as sete da manhã até às dezoito horas, quando lhes seriam entregues as provas. Porém, por um problema de comunicação, nem todos foram avisados de onde seria esse local. Eu fui uma das contempladas...
Faltando cerca de vinte minutos para o início da prova, cheguei à sala onde julgava que seria minha prova, e fui informada que eu deveria me dirigir para o local onde os “sabatistas” ficariam confinados. O detalhe é que ninguém sabia informar onde era esse local, que só descobri depois de uns dez telefonemas e algumas lágrimas desesperadas. Mas como chegar lá? Novamente, ninguém sabia informar. Uma fiscal mais caridosa se ofereceu para procurar conosco pela Cidade Universitária, mas demos voltas e mais voltas sem conseguir achar o destino. Eu já não chorava: entrei em estado catatônico imaginando um longo ano de cursinho. Mas exatamente às sete horas, avistamos o prédio do confinamento: buzina desesperada, clamores desesperados, pernas desesperadas, e a porta do prédio se fechando bem atrás de mim, no segundo posterior a minha entrada.
Desabei num choro compulsivo de alívio, e uma hora depois ainda me agarrava à cadeira para me certificar que tinha mesmo conseguido chegar, que não tinha ficado de fora do evento mais importante da minha vida estudantil...
Ficar de fora não é nada agradável. A minha infância toda sofri com isso porque sou da geração “do meio”, portanto era enxotada das rodas de conversas e risadinhas das primas grandes por ser boba demais, e expulsa das brincadeiras dos primos pequenos por levar vantagem em ser maior que eles. Portanto sei bem como é chato as sensação de não conseguir estar entre os demais, no lugar almejado, em que as coisas importantes acontecem. Qual ser humano gosta de se sentir out, sem participar do mundo ao redor nem ter sua vida inserida numa realidade que deseja mas só os outros participam?
Jesus insistiu sobre esse “ficar de fora”, contando parábolas que retrataram bem como isso é triste. Em Lucas 16: 19, ele falou de um rico que desprezou a vida inteira o mendigo Lázaro, para só depois se dar conta que, não obstante sua aparente religiosidade, ficara de fora das bênçãos divinas. Em Mateus, no capítulo 13, versículo 47, ele conta dos peixes que, já bem seguros nas redes dos pescadores, ficaram fora da pesca, sendo jogados fora por não serem de boa qualidade. No capítulo 25 nos diz de cinco virgens que se embonecaram para a festa de casamento mais esperada e concorrida do ano, mas cochilaram sem lembrar de comprar mais óleo para suas lâmpadas, com as quais iluminariam a procissão do casamento, como era o costume. Tiveram de sair para comprar mais óleo e ao voltar, a festa já havia começado e elas ficaram de fora... um pouco mais adiante, no verso 33, Cristo fala da separação entre ovelhas e cabritos, estes últimos , sendo comunicados que foram condenados a ficar de fora do aprisco do Bom Pastor. E no capítulo 22 de Mateus, Jesus fala de um penetra que queria tanto estar dentro da festa mas não se preparou para a solenidade da ocasião, e não só ficou de fora como foi expulso debaixo de pancada.
Todos esses ficaram a chorar e ranger os dentes, por perderem o lugar entre os demais. Cada parábola explica um motivo para isso: o rico confiou demais na própria justiça, os peixes achavam que só pelo fato de estarem no meio dos outros seriam considerados tão bons quanto deveriam ser, as cinco virgens néscias aguardavam o noivo sem se prepararem para o evento, os cabritos sustentavam o título de cristãos sem jamais se darem conta das necessidades dos seus semelhantes, para amá-los como a si próprios, e o penetra do casamento não atentou que sua condição destoava com o lugar em que desejava estar. Não é preciso fazer muito esforço para perceber uma aplicação espiritual bem visível para todo nós, que como cristãos queremos alcançar o Reino que Ele nos prometeu.
Mas Jesus sempre vai além: ele não dá só o diagnóstico, mas prescreve o remédio. É por isso que a Bíblia também está cheia de relatos de gente que não se conformou em ficar de fora. Que o diga Zaqueu, que tinha todos os motivos para fugir dAquele que podia ver cada um dos seus vários pecados, mas a despeito disso não se conformou (nem com sua impossibilidade física) e chegou ao ridículo de subir numa árvore para ver o Mestre. Tem também o cego Bartimeu, lutando contra a multidão que tentava fazê-lo calar e gritando bem alto por misericórdia, para não ficar de fora de obter a bênção desejada (Marcos 10:46). O mesmo fez a mulher com um fluxo de sangue que lhe consumia, a qual não se conformou em ficar de fora da vida em abundância que prometia o Messias, e desafiando a palavra de todos que a desenganaram, agarrou firme no manto de Jesus e obteve o seu quinhão (Mateus 9:20). E eu não poderia deixar de citar o paralítico, que já passara tanto tempo sofrendo em sua incapacidade, era tão desprezível em face dos homens e tão impotente para chegar a Jesus, coitado... coitado nada! Ele venceu a auto-piedade, conseguiu ajuda e – bem atípico para um paralítico - destelhou até uma casa para não ficar de fora do lugar onde estava o Filho do Homem!
Para quem sabe exatamente onde quer chegar e caminha preparado nessa direção, nunca faltará a recompensa, nunca haverá a sensação de ficar de fora. Deus prepara para nós caminhos que nos levarão a lugares especiais, onde encontraremos a tão sonhada felicidade. Aqui mesmo na Terra já podemos ter um antegozo do Céu, deixando-nos guiar suave e confiantemente para onde Ele nos quer levar. Não vale a pena se conformar em ficar de fora, porque o que quer que nos prenda lá não justifica perder o que nos espera nos planos de Deus. Não é vantagem se acostumar à mediocridade do lado de fora: é só lutando que tomaremos posse do nosso verdadeiro lugar, mesmo que ele nos pareça distante em nossa visão encoberta de lágrimas, dúvidas ou medo. É lá dentro, pertinho dEle que devemos estar.

Uma semana feliz e iluminada!

Lux Lunae

domingo, 12 de novembro de 2000

Atenção às nuvenzinhas!

“E olhei, e eis uma nuvem ...” Apocalipse 14:14

Depois de sofrer durante cinco meses o inverno de São Paulo (desesperador para quem tinha como conceito de “frio de rachar” a temperatura de vinte graus centígrados), estou, finalmente, tendo o prazer de sentir o meu saudoso sol. Relembrando no calor da pele, minha condição de filha da terra Natal, a colônia morena sentada no litoral brasileiro. Forte dos Reis Magos seu brinco de estrela, ondas de Ponta Negra seu leve vestido branco, moça risonha e indolente, que embora parceira fiel de traquinagens do vento, ostenta o título nupcial de Cidade do Sol.
Tomada por esse saudosismo que ataca os poetas nordestinos longe de casa, resolvi desenterrar algumas peças do meu guarda-roupa que não via há muito tempo, e sair para comemorar a ressurreição das minhas glândulas sudoríparas. Encontrei um vestido claro, leve e florido, o qual combinava perfeitamente com as sandálias carentes de pés há meses, e com o tempo lá fora. Abri a porta de minha casa, respirei fundo a brisa morna e olhei para o céu de azul-vivo-e-vivificador. Vi lá ao longe, uma pequena nuvem negra, quase imperceptível e lembrei-me das recomendações da minha amiga Lucy antes de eu vir para São Paulo: “mesmo que o dia esteja super ensolarado, leve sempre uma sombrinha e um casaquinho na bolsa”, mas convenci-me de que aquela nuvenzinha não era nada no meio do oceano de luz que estava aberto diante de mim. E lá fui eu andando tranquila e feliz.
Uma hora depois eu voltava para casa, o vestido encharcado gotejando água sobre as tiras descoladas das sandálias, que eu arrastava sofregamente contra a correnteza de lama que descia a ladeira da minha rua. Mal conseguia enxergar onde pisava porque o vento forte arremessava a chuva contra mim, e os trovões e raios completavam a cena dantesca. Chegando em casa, ainda mais saudosa do sol de Natal, me perguntava por que eu não dera ouvidos ao conselho da Lucy e subestimei o poder daquela nuvenzinha negra.
- Deveria ter lembrado da história de Elias! – falou um amigo meu, mal conseguindo conter as risadas ao se deparar com aquela criatura desfigurada, parecendo ter sobrevivido a uma enchente.
Deveria mesmo!
Elias orara a Deus para que não chovesse sobre a terra, pois Seu povo havia esquecido completamente dEle, e agora trilhava os caminhos da iniquidade e da apostasia. E durante três anos e seis meses, nem uma gota sequer se precipitou sobre o solo. Mas Elias convidou o povo a se humilhar e tornar para o Senhor, confessando seus pecados e reconhecendo o Deus de seus pais como o Deus vivo. Os profetas de Baal foram eliminados e agora a maldição do Céu devia ser retirada e renovadas as bênçãos temporais de vida.
A terra ainda estava mais ressequida que nunca, mas Elias disse ao rei Acabe: “Pode ficar tranquilo que eu já posso ouvir ruído de abundante chuva” e vai ver até lhe recomendou andar com um casaquinho e uma sombrinha. Depois, Elias subiu ao Monte Carmelo e lá orou fervorosamente confiando que, o mesmo Deus que havia mandado a estiagem ,tinha prometido abundância de chuvas como recompensa do reto proceder, e agora Elias esperava pelo derramamento prometido. Por sete vezes ele mandou seu ajudante ir olhar se havia algum sinal no céu de que Deus ouvira suas orações, e na sétima recebeu a resposta: “Eis que se levanta do mar uma nuvem pequena como a palma da mão do homem” (I Reis 18: 44). O profeta poderia ter pensado que só uma nuvenzinha não queria dizer nada, mas pela fé contemplou nela uma abundância de chuva. Antes mesmo de ver o pequeno sinal no céu, ele tinha certeza que Deus agiria, e clamou em oração pelo que já esperava confiantemente. Que fé! E Elias “era homem sujeito às mesmas paixões que nós” (Tiago 5:17), a diferença é que ele acreditava num Deus cuja palavra é eterna e cumpre cada promessa com fidelidade.
Muitas vezes nos encontramos no deserto de nossa desesperança, morrendo de sede de justiça, amor e paz, mas esquecemos que ele prometeu saciar-nos (Mateus 5:6). Deixamos nossos problemas nos prostrar e nossos sonhos jazem tão ressequidos quanto a terra em que nossos pés machucados estão. Mas não nos apossamos das promessas que Cristo deu para cada problema humano, e que estão registradas na Bíblia, justamente para que não esqueçamos de crer nelas. Experimente apenas lembrar, e se a ferida dói tanto e tanto que você já não consegue nem pensar... abra a carta de Deus para você e leia! Elas estão lá!
É importante esquecer tudo o que o ser humano lhe ensinou sobre promessas. Vivemos num mundo de promessas quebradas e desde cedo aprendemos que boa parte do que os seres humanos nos prometem não passam de mentiras, ou alimento de ilusões. Eu bem sei disso! Tudo começou com a serpente lá no Édem, prometendo que Eva viveria para sempre. Depois minha professora me garantiu que Papai Noel deixaria um presente embaixo da cama e tudo que eu vi foram minhas sandálias. Veio então minha madrinha, que me deixou desde o cinco anos até hoje esperando uma boneca de presente. E seguiram-se a série de decepções: as juras de amor eterno do primeiro namorado, o pagamento do salário atrasado no primeiro emprego, a amizade que não resistiu à primeira prova, a plataforma política do candidato a quem dei meu primeiro voto, tantas outras que você também deve conhecer bem. E aí acontece uma coisa interessante. Sempre que uma nova promessa surge, tendemos a reagir a ela segundo nossa história de decepções com todas as promessas não cumpridas. E de repente até as promessas de Deus podem nos parecer sem força... mas é exatamente isso que o nosso arquinimigo quer. Porque se duvidarmos das promessas de Deus, fechamos as portas para que elas se cumpram em nossas vidas.
Por isso creia. E mesmo que o coração teime, que a razão questione, que há muito tempo você esteja esperando uma gota de bênção para refrescar sua angústia, e o sol castigue sem que você sinta o menor prenúncio da resposta divina, creia na promessa que Deus reservou para você. E em seguida dê mais uma olhadinha no céu. Talvez perceba uma pequena nuvenzinha lá ao longe, e veja ela crescer proporcionalmente a sua fé e se derramar copiosamente sobre você.
Se mantermos o hábito de erguer o olhar do caminho desértico e o lançarmos com fé ao céu, nunca perderemos de vista os sinais de que Deus está bem perto e agirá no tempo certo. Não duvide das promessas e continue olhando para cima. É de lá que virá a solução e, muito em breve, o cumprimento da mais bela das promessas. A escritora Ellen White, não era meteorologista, mas sabia bem o significado de vigiar o céu. Uma das visões que o Espírito Santo permitiu que ela tivesse, me comove muito e gostaria de concluir partilhando-a com vocês:
“Surge logo no Oriente uma pequena nuvem negra, aproximadamente da metade do tamanho da mão de um homem. É a nuvem que rodeia o Salvador, e que, a distância, parece estar envolta em trevas. O povo de Deus sabe ser esse o sinal do Filho do homem. Em solene silêncio fitam-na enquanto se aproxima da Terra, mais e mais brilhante e gloriosa, até se tornar grande nuvem branca, mostrando na base uma glória semelhante ao fogo consumidor e encimada pelo arco-íris do concerto. Jesus, na nuvem, avança como poderoso vencedor.(...) Com antífonas de melodia celestial, os santos anjos, em vasta e inumerável multidão, acompanham-nO em Seu avanço. Aproximando-se ainda mais a nuvem viva, todos os olhos contemplam o Príncipe da vida. Nenhuma coroa de espinhos agora desfigura a sagrada cabeça, mas um diadema de glória repousa sobre a santa fronte. O semblante divino irradia o fulgor deslumbrante do Sol meridiano. “E no vestido e na Sua coxa tem escrito este nome: Rei dos reis e Senhor dos senhores.” Apoc. 19:16. Os justos clamam, a tremer: “Quem poderá subsistir?” Silencia o cântico dos anjos, e há um tempo de terrível silêncio. Ouve-se, então, a voz de Jesus, dizendo: “A Minha graça te basta.” Ilumina-se a face dos justos, e a alegria enche todos os corações.”
Uma semana feliz e iluminada!

Lux Lunae

domingo, 5 de novembro de 2000

Sei de um lugar de paz

“Sei de um lugar de paz, longe de toda dor,
Aonde vou a luz buscar.
Entre a vegetação, prostrado em oração,
A Deus entrego o meu pesar.
Bem cedo de manhã, ou no cair do sol,
Eu deixo lá o meu temor;
E deste bom lugar eu saio pra enfrentar
A vida com muito mais amor”
(Lugar de Paz – Hino 413 do Hinário Adventista)

Sempre encontrei paz nas coisas brandas. A felicidade não se me revela na explosão, no tumulto do êxtase nem na perda dos sentidos, como muitos a entendem. Felicidade, para mim, sempre teve ares de calmaria, plácida e segura, mãos dadas ao equilíbrio, irmã da paz.
E quando lembro dos momentos em que vivi o amor na sua mais profunda expressão, vejo-o suave e tépido, chamando por minha entrega com mansidão sobremaneira persuasiva, inquestionável. Vejo a mim recebendo-o com pureza; na confiança que sobrepuja o medo, na consciência que dá sentido às sensações, na escolha ética que substitui o impulso do instinto, na razão que corrobora o sentimento, na certeza que vence a defesa, no carinho em detrimento da carícia, na renúncia que toma o lugar da auto-satisfação, na liberdade que convence de um único caminho, e sempre, na paz de uma calma celestial.
Penso que Deus tem os mais preciosos sentimentos, tais como o amor e a felicidade, bem como a Sua própria presença , guardados para o ser humano que os procura na contemplação da paz, daquele que necessariamente aguça todos os sentidos, esquecendo-se de si mesmo para encontrar-se em seu verdadeiro lugar. Os tesouros são entregues aos que se entregam completa e confiantemente à missão de os buscar, e para os achar há que, necessariamente, ir até onde eles estão. Os tesouros que Deus reservou para serem sentidos por nós estão escondidos num lugar de paz, onde a verdade das coisas humanas se revelam.
Onde é esse lugar? Pode ser no templo de oração, pode ser o ônibus na volta do trabalho, pode ainda ser no quintal da sua da sua casa, na beira da praia, no alto da montanha, no leito da doença, no banco do seu carro, esperando a esfiha na lanchonete, num abraço carinhoso da pessoa amada, pode até mesmo ser exatamente aí no lugar em que você está. O lugar de paz é aquele em que você pára e se dá conta que pode ter tudo aquilo que Deus sempre sonhou para você. E mais: esse lugar é quase sempre confundido com o fim, porque é diante dele que chegamos quando sentimos já não haver nada em nós, que nossos planos falharam e o que construímos com nossas mãos não nos deu o que queríamos.
Certo dia, se aperceberam disso os seguidores de Jesus de Nazaré.
A tarde caía silenciosa e uma atmosfera deprimente enchia todos os espaços. Reunidos dentro de uma casa trancada à sete chaves, os discípulos sentiam que havia chegado o fim. Tantos planos para o Reino de que o Mestre falara! Tantos sonhos de um novo Israel sob o comando dEle! Tanto poder que Ele demonstrara, convencendo-os que seria capaz disso! E agora... ele jazia num sepulcro. Aconteceu tudo tão rápido! Pedro até que tentou evitar que aquilo acontecesse, se dispondo a enfrentar quem fosse para manter o Mestre junto de si. Mas Jesus o repreendera e partiu para nunca mais voltar... de que adiantara terem abandonado o lar e partido para o desconhecido para viverem com esforço, privação, perseguição e abnegação, com tanta coragem e sofrimento? Relembravam cada momento sem conseguir assimilar aquela perda não planejada. Os momentos bons passados ao lado de Cristo, os milagres, a autoridade dada para vencer o mundo, os ensinos preciosos que rememoravam com carinho e que levariam por toda a vida... mas agora... agora estava tudo terminado. O que fazer? Esquecer tudo aquilo e voltar à antiga vida? Impossível! Conviver com Jesus mudou todos os padrões daqueles homens, que já não viam a Deus, ao mundo e às pessoas com os mesmos olhos e anseios de antes. Tinham chegado muito perto da felicidade, e qualquer coisa abaixo disso lhes figuraria a mais tediosa frustração.
Mas “veio Jesus e pôs-se no meio deles” (João 20: 19), e aquele lugar mudou. Em Sua primeira aparição aos discípulos, depois de ressurgido, o Salvador a eles Se dirigiu com as palavras: “ Paz seja convosco”, então “abriu-lhes o entendimento para compreenderem” (Lucas 24:45) e os discípulos encontraram ali, onde antes habitava o medo, a ansiedade e a angústia, um lugar de paz. De repente tudo lhes pareceu claro aos seus olhos, porque simplesmente pararam de olhar para si mesmos e viram o que Deus tinha planejado para eles. Viram, e aguçaram os sentidos para tocar na condição que lhes estava reservada terem, se houvessem, desde o início, permitido o Espírito Santo falar mais alto aos seus corações. Desapontados consigo mesmos, identificaram seus próprios erros, reconheceram onde falharam, sentiram seus corações tão quebrantados que seus olhares eram um pedido de perdão. E o que parecia ser o fim tornou-se o início de uma nova e abençoada caminhada.
Jamais tornariam a ter aquele contato íntimo que o Salvador entreteve com eles por três anos, mas agora tinham descoberto o tesouro: entenderam o amor de Jesus, tomaram noção do Seu significado em suas vidas, e descobriram que, nesse período de convívio, fora lhes dado a perceber a grandeza da felicidade que lhes estava reservada, bem como concedidas graciosamente todas as chaves para chegar até ela. Uma transformação profunda ocorreu naquelas almas, e eles saíram daquele lugar de paz, prontos para enfrentarem a vida com muito mais amor, segurança, equilíbrio, maturidade, verdade, esperança e, é claro, a mais sublime e inexpugnável paz.
Não havia mais a ânsia apaixonada e cega dos próprios desejos, porque ela nunca deveria ter existido. Nem nunca mais existiria, depois da visão reveladora sobre a Pessoa do Amor, porque os discípulos encontraram a Verdade de Deus e de si mesmos na calma introspectiva e renovadora daquele bom lugar...
Deixe Jesus entrar agora e faça desse lugar, o seu lugar de paz. Olhe bem e perceberá que, no muro que lhe parece pôr fim ao caminho há uma porta. Ele diz: “Eis que estou à porta, e bato; se alguém ouvir a Minha voz, e abrir a porta, entrarei em sua casa, e com ele cearei, e ele comigo.” Convide-o a ficar contigo. E prove, para nunca mais esquecer, seu ser existindo através dos sentidos de Deus.
Um sábado feliz e iluminado.

Lux Lunae