domingo, 30 de julho de 2000

Confiar e Esperar

“...Agora, pois, permanecem a fé, a esperança e o amor...” I Cor. 13:12

Esta semana tive o prazer de degustar a leitura de mais um livro velhinho e fascinante. E como toda leitura realmente prazerosa, esta foi também despretensiosa e sem nenhum interesse específico, sendo que me trouxe ao final, importantes e fortes impressões. Trata-se do livro “O Conde de Monte Cristo”, de Alexandre Dumas, um clássico da literatura juvenil (do tempo que literatura juvenil virava clássico). A trama é envolvente, e discorre sobre um jovem que é privado de todos os seus sonhos e esperanças estando prestes a realizá-los, passando de forma injusta e cruel, a ruminar sua desgraça num presídio de segurança máxima. Porém, depois de uma longa espera, a vida lhe deu a oportunidade de mudar o jogo e fazer justiça contra os que o traíram e atraiçoaram. Este jovem, que depois de provar o fel do cárcere e da traição, teria todos os motivos para tornar-se insensível, soberbo, frio, mas justamente por conhecer o significado de sua dor, termina a história com uma frase louvável: “Toda sabedoria humana se resume nestas duas palavras: confiar e esperar!”
Meditando sobre esta afirmação cheguei a conclusão que estas são, de fato, coisas muito difíceis de praticar hoje em dia, daí ser árduo o caminho que leva à sabedoria. Satanás também sabe de nossa fragilidade nesses pontos, pois conhece bem esta raça que desespera ao invés de esperar e aprende a trair ao invés de confiar. Esta raça cheias de extremos que necessita do equilíbrio em Cristo Jesus... falo de extremos porque, ordinariamente, nossas emoções costumam fazer nossas certezas mudarem abruptamente quando postas em prova. Vejamos alguns exemplos disso.
Já que estamos falando de condes, citemos um não tão feliz como o primeiro. No filme “Drácula por Bran Stocker”, temos uma curiosa ilustração na história de como o guerreiro Drácon vira o conde vampirão. O conde sai para guerrear numa Cruzada e deixa sua bela esposa no castelo, pedindo que ela o espere, pois em breve ele voltaria vitorioso. De fato, ele venceu a batalha, mas alguns inimigos sobreviventes enviaram uma carta falsa à doce condessa dizendo que seu marido havia tombado em batalha. A mulher, ao invés de confiar e esperar no que seu amado dissera, desesperou-se e se jogou no rio que cercava seu castelo, encontrando a morte eterna. Embora hoje eu esteja cheia de ilustrações fictícias, acho que não é difícil identificarmos tal atitude em muitos de nós no dia-a-dia. Tudo bem que nem todos se jogam no rio mais próximo – o Tietê por exemplo, mata o desejo do suicida antes que ele se mate, afinal ele não quer correr o risco de escapar fedendo... mas muitos são os que, desesperados, recorrem ao álcool, às drogas, à promiscuidade, ou simplesmente desistem de viver, se atolando na depressão, tornam-se pessoas desanimadas, negativas, invejosas, incapazes de sorrir para o futuro com alegria ou de olhar para o lado bom das coisas. Quantos, pior ainda, desistem de Deus, da sua religião, e prosseguem abatidas e vazias, mesmo que disfarçadas pela capa do nominalismo cristão... Desistir de esperar é desesperar, e entregar-se à derrota própria.
Um episódio que também traz significante ilustração, o qual me chamou atenção por ser vida real rotulada com as mãos da literatura, aconteceu hoje, quando eu vinha do estágio num ônibus. Um rapaz em pé, um pouco mais a minha frente, ostentava na camiseta negra, letras graúdas com parte do lúgubre poema de Augusto dos Anjos:

“...Acostuma-te à lama que te espera!
O Homem, que, nesta terra miserável,
Mora entre feras, sente inevitável
Necessidade de também ser fera.
O beijo, amigo, é a véspera do escarro,
A mão que afaga é a mesma que apedreja.”


Olhando a expressão e o olhar daquele rapaz, não pude deixar de sentir um calafrio me percorrer a espinha. Sua manifestação explícita traduz o que a princípio é a dor da perda da inocência, mas transforma-se num maligno instinto de sobrevivência: por desacreditar na confiança, aprende-se a trair, e a regra é encarar a todos como inimigos em potencial, que neste exato momento podem estar buscando um modo de fazer você sofrer. É muito mais difícil confiar, conservando os valores e as crenças puras, é terrivelmente mais doloroso optar pelo amor e pelo perdão. Tão calejados estão nossos corações, que a saída mais fácil e atraente é ceder à necessidade de também ser fera... um coração ferino estará sempre alerta contra a falsidade de toda demonstração de afeto, se sentirá sempre vitorioso por apedrejar a mão que afaga antes que esta o faça de tolo. E trocará o perigoso prazer de um beijo (por certo traiçoeiro) pela satisfação de um escarro na boca que, como aconteceu tantas vezes, está prestes a lhe trair. Podem até haver inocentes, mas estes são olhados com simplórias criaturas que devem ser doutrinadas a sobreviver na selva, o mais rápido possível.
Como seres pecadores mas que ainda carregam traços de semelhança com Deus, trazemos lá no fundo o desejo de crer na confiança que nasce do amor, mas o medo da decepção a qual está espreitando em cada esquina do caminho estreito que leva à felicidade, nos faz recuar. Abandonando a confiança estamos mais tristes, porém, nos sentimos mais protegidos em nossa auto-suficiência. Desistir de confiar é aprender a trair, e se entregar à derrota alheia.
Felizmente o maior Literata de todos os tempos, que também é Conde e cujo condado nada mais é que o Universo, nos deixou em seus ensinos a certeza de que toda a Felicidade humana se resume em duas atitudes: confiar e esperar nEle. Eu creio nEste Deus que cumpre suas promessas de amor e justiça, e leio claramente na Bíblia que os covardes não terão parte no Novo Lar Perfeito que nos aguarda. Para ser capaz de continuar esperando e confiando em meio a este mundo, é preciso ter muita coragem. A vitória, no entanto, está reservada a estes homens, “homens que não se comprem nem se vendam, homens que no íntimo da alma sejam verdadeiros e honestos, homens cuja consciência seja tão fiel como a bússola o é ao pólo, homens que permaneçam firmes pelo que é reto, ainda que caiam os céus”. (Ellen G. White, Educação, pág. 57)
Os que não desistem de esperar, contemplam hoje, em parte, a salvação, a qual verão brevemente, face a face (Salmo 62:1). Os que esperam são os que deixaram seu amor falar mais alto que as injustiças, traições, maldades e mentiras dos inimigos, suas vidas refletem a paz e segurança de estarem firmados neste amor supremo, suas faces revelam que desde já eles são vitoriosos. Os que não desistem de confiar, são os que não se contaminaram com os corações ferinos, antes, seguem o Cordeiro para onde quer que Ele for (Apocalipse 14: 4). Os que confiam são os bem-aventurados que hoje choram, mas são mansos, misericordiosos, limpos de coração e pacificadores; eles serão consolados, herdarão a Terra e verão ao seu Pai, tendo saciadas a sua fome e sede de justiça. Os que confiam e esperam vencerão o mundo por permanecerem no amor.
Uma semana feliz e iluminada!

Lux Lunae

domingo, 23 de julho de 2000

Quando alguém muda os seus planos

"Conceda-te conforme ao teu coração, e cumpra todo o teu plano". Salmo 20:4

Resolvi preparar uma surpresa para a minha avó paterna e telefonei para ela hoje. Foi muito gostoso falar com ela apesar das lágrimas mútuas, em compensação ouvi suas reclamações acaloradas pois, devido aquela característica de despedidas não me apetecerem, eu fui embora sem dizer para ela, ainda que tenha passado o último fim-de-semana em Natal na casa dela.
Foi, aliás, um dia muito gostoso, literalmente, principalmente à hora do almoço... e como pede todo almoço em casa de avó, sugeri que ela nos contasse uma velha história, perguntei como ela tinha conhecido meu avô (que já descansa). Ela então começou uma narrativa que prendeu a atenção de todos que estavam na cozinha, e quem passava, ficava para ouvir, de modo que a família toda se apertou para acompanhar a narração recheada de gargalhadas e alguns nós na garganta... uma tragi-comédia que colocaria qualquer novela do SBT no chinelo.
Minha avó, quando adolescente, se apaixonou perdidamente por um rapaz que morava em seu bairro, o qual caiu de quatro pelos encantos da menina. Mais uma linda história de amor, não fosse a existência da tia Elisa.
Tia Elisa era uma amiga da minha avó na época, e irmã do meu avô. Ela morreu com mais de noventa anos, solteirinha da silva, depois de um histórico de maldades de fazer inveja ao curriculo da madastra da Branca de Neve. Quando tia Elisa soube da paixão avassaladora de minha avó, resolveu jogar areia nela e começou seus planos maquiavélicos. Descobriu que o rapaz era motorista de táxi e foi até a mãe de minha avó e delatou tudo, enfatizando que "motorista é uma raça que não presta" e "ele só quer se aproveitar da Maria". Não deu outra. A minha bisa proibiu o namoro. Mas isso não os impediu de se encontrarem às escondidas... Tia Elisa então, tentou algo mais pesado: chantageou a empregada da casa da minha avó para fazê-la inventar a confissão de que tinha andado fazendo "sem-vergonhices" com o namorado da minha avó. E ainda forjou um flagra. Quando o pobre rapaz chegou, num domingo, do quartel onde prestava serviço militar, minha tia o procurou dizendo que vó Maria mandaria um recado para ele pela empregada, e marcou hora e lugar. Ela então correu à casa de vovó, enquanto a empregada ía ao encontro dele para simular o "affair", e, nervosamente, convidou minha avó a flagrar a suposta traição. Quando a empregada avistou minha avó, agarrou o namorado dela, que a empurrou, mas já era tarde: tia Elisa já havia convencido-a que ele era um canalha imprestável que vinha traindo-a há muito tempo. Mas como o rapaz ainda a procurasse (em vão) constantemente, para tentar explicar-se , minha querida tia armou o golpe de misericórida.
Ela começou a sugestionar o meu avô ,irmão ela, a namorar minha avó, e ele, vocês devem imaginar, achou a idéia agradável. Tia Elisa então, chamou minha avó para visitá-la e combinou com meu avô para esperá-la à porta e puxar conversa com ela para dar início à paquera. Depois correu ao ponto de táxi onde o ex-namorado de minha avó ficava, e disse-lhe que ele parasse de ser besta e ir atrás da Maria porque ela já estava namorando o Gaspar (meu vô), há muito tempo, desde quando ela ainda se encontrava com o motorista. E como ele, raivoso, afirmasse que ela estava mentindo, ela o levou até a sua casa, onde flagrou meu avô conversando com minha avó , enquanto tentava tocar-lhe os cabelos. O pobre taxista, agora desiludido, ficou pálido e se aproximou da minha avó dizendo-lhe duras palavras, e depois disso nunca mais a procurou. Ela só veio entender o que aconteceu, anos mais tarde, quando a própria tia Elisa, contou-lhe tudo.
E meu avô acabou casando com minha vozinha, mas não antes da nossa cara vilã convencê-lo a raptá-la, inventando uma mentira sobre a mãe dela querer levá-la embora para Recife, somente para difamar a minha avó, visto que "casar fugida" naquela época era uma das maiores vergonhas e desgostos que se podia dar aos pais. Bem, os últimos anos da tia Elisa foram cheios de sofrimentos (na verdade acho que todos foram), mas foi minha avó que cuidou dela até sua morte, e parece que não guardou mágoas de toda injustiça que passou por causa da minha tia bruxinha. Mas perder um grande amor e o respeito da sociedade só porque alguém resolveu mudar os planos, não deve ser fácil de perdoar.
Penso que para Deus também não deve ter sido nada agradável ver Seus planos de felicidade para a humanidade, serem mudados por causa da inveja, orgulho e maldade de um ser que Ele mesmo criou, e O servia frente a frente, todo o tempo. O pior é que este ser se especializou em ser o "estraga-prazer" dos planos para a vida de todos os filhos de Deus.
Satanás se diverte inventando artimanhas para acabar com a real felicidade de cada um de nós , e seus planos são inteligentes e bem-traçados, com a experiência de um estrategista milenar, de modo que muitas vezes caimos em suas armadilhas sem nem desconfiarmos de que lado está a verdade. E como foi com minha avó, só depois de algum tempo, quando já não há nada a ser feito, é que descobrimos desolados que fomos enganados, ludibriados, manipulados até, e acabamos por perder tudo que estava originalmente planejado sem que tivéssemos culpa consciente disso.
Eu e você, no entanto, contamos com um trunfo que minha avó não tinha: Alguém não só sabe como é a própria verdade e quer nos proteger das maldades de nosso arqui-inimigo. O Deus em que nós cremos, é Aquele que conseguiu driblar as risadas de satisfação de Satanás quando ele levou o pecado a Adão, com um plano perfeito de salvação. Aquele que transformou o gozo de alegria de Satanás, ao ver Cristo pregado morto na cruz, em angústia mortal, quando deu ao Seu Filho a vitória sobre a morte e a sepultura. Aquele que é capaz de nos tomar no meio da situação mais deprimente, no poço mais fundo, da mais escura rua sem saída, do deserto mais árido e da selva mais densa, e tomando-nos em Seus braços, conduzir-nos ao caminho verdejante das águas de descanso. Um Deus-Pastor que tem prazer em carregar suas ovelhas em Seus braços, junto ao peito, enquanto mansamente sussurra: "descanse do seu labor, sua luta árdua, sua decepção e de todo esse medo e insegurança que agora toma conta de você. Deixe que eu leve seus fardos e simplesmente se deixe guiar...". (Isaías 40:11, Mateus 11:28). Com um Deus assim, o que temer? O que fazer se não tomar Seu suave jugo e aprender da mansidão e humildade que emanam do Seu coração? (Mateus11:29).
Quando alguém muda os seus planos, o melhor é permitir que Deus entre com os planos dELe. Jesus, mais que ninguém, conhece a tristeza da frustração; Ele foi homem como eu e você. Em Sua eterna perfeição, Ele consegue transformar toda essa frustração em gozo de vitória. Ainda que tenhamos sido nós a abandonar Seu plano inicial de felicidade total, ou tenhamos sido enganados pelas artimanhas deletérias do Maligno ou simplesmente estejamos cegos para ver que os nossos planos não são os dELe, há algo de muito maior e melhor logo atrás do Monte para onde Ele quer nos levar; há felicidade real, num conceito que nossas limitadas mentes jamais poderão conceber, nem em uma pálida idéia.(Isaias 64:4)
Minha avó, com seu riso largo ao fim da sua triste história, me ensinou algo importantíssimo: mudança de planos não significa derrota. E cá para nós, se minha avó não tivesse casado com meu avô e passado por tantas coisas que lhe acrescentaram uma sabedoria enorme, eu não teria a bênção da sua presença e exemplo! E ela não teria uma neta coruja que lhe amasse tanto quanto eu, hehehe.
Somos todos mais que vencedores por meio dAquele que nos amou, e os planos para as vidas dos filhos do Grande Deus Todo-Poderoso são histórias de um povo que desde a antiguidade nasceu como raça eleita para a vitória, histórias com muitos enredos, caminhos que se cruzam, se afastam dando voltas e se bifurcam brusca ou sutilmente... mas acima de tudo vidas com o mesmo fim: o cumprimento do Plano maior que jamais será frustrado, do qual força inimiga nenhuma nos afastará, o Plano da Salvação Gloriosa em Cristo Jesus.
Uma Semana Feliz e Iluminada!

Lux Lunae

domingo, 16 de julho de 2000

O amor admirável

"Quando [o Senhor] vier para ser glorificado nos seus santos e ser admirado em todos os que creram..." II Ts 1:10

Depois de mais de seis meses sem acariciar a tecla de um piano tive o ímpeto e a oportunidade de sentar tranquilamente diante de um (i.e., sem observadores). Reuni minhas partituras mais queridas e me pus a dedilhar o instrumento.
O que me motivou a buscá-lo, eu sabia bem, era a vã tentativa de preencher minha mente para tentar esquecer um problema específico que me atordoou o dia inteiro, mas justamente tal problema me fazia incapaz de concentrar-me como deveria, de modo que eu divagava intermitantemente entre o pentagrama e ele. Quando enfim conseguia virar uma página, um bemol qualquer me lembrava a gravidade do problema, que ainda estava lá, por trás da clave de fá. A carta foi objetiva e a caligrafia denotava uma escrita nervosa e emocionada.
Uma amiga muito querida, que me acompanha desde que conheci Jesus, como uma verdadeira irmã, e que sempre me animava com seu sorriso constante, expunha, desolada, a ruína de seu casamento. E no seu caso não é apenas mais um casamento, mas o casamento que todos tinham por modelo. Lembrei da época em que se deu o matrimônio, aliás, eu mesma, noiva na época , quase caso também movida pelo clima de ansiedade que envolvia a todos e ao casal. Ambos eram cristãos atuantes, jovens cheios de planos e inteligentes. Agora se separam e ela me diz que o convívio estava impossível, que já não havia amor. O que houve de errado?
Me aborreci com a questão que me tomou o dia todo e voltei ao piano, mas a primeira nota era justamente um si bemol que me impediu de continuar com seu som de pergunta. Me veio então vivamente à memória a frase de um amigo pianista que conhecia muito bem minha admiração pelo instrumento e acompanhou meus primeiros passos. Ele dizia: "Não se centre na admiração que você tem pelo instrumento ou pelo que ele pode fazer, admire o que vocês podem fazer juntos, admire o que vocês são quando se unem, sob pena de uma desastrosa mediocridade". E agora eu tinha uma hipótese musical para a separação.
Lembrando com mais detalhes, percebi que a admiração mútua foi o que fez aquele casal se unir. Eles viam no outro o cônjuge ideal pela série de qualidades que apresentavam, mas juntos não eram ou faziam nada que pudessem admirar também; a união com o outro era apenas mais um modo de atrair mais admiração para si. Admirar e amar nem sempre são a mesma coisa.
É engraçado mas quando as pessoas vão justificar porque estão bem com seus cônjuges, elas começam a dar uma lista de virtudes das pessoas. O importante é saber até que ponto tais virtudes importam realmente para elas... por outro lado, um homem pode admirar a Sharon Stone, a Marta Suplicy e até a Carla Perez, mas amar profundamente a sua esposa, devotando-lhe admiração especial. Porque nenhuma outra mulher, com mais qualidades ou dotes físicos e/ou intelectuais desperta nele sentimentos, ações, vontades tão especialmente admiráveis, porque nenhuma outra conseguiu penetrar na sua vida e fazê-lo feliz. Então qualquer outra jamais a superará, ainda que acumule trilhões de adjetivos maravilhosos.
A nossa relação com Deus não é diferente. A história bíblica fala de um Cristo admirável, isso confessa o mais veemente ateu. A minha religião pode ser, doutrinária e teologicamente, admirável, mas a admiração que eu lhe tenho não é diferente da que tenho quando me deparo com inteligentíssimas filosofias temporais. O detalhe que fará minha religião e minha relação com Deus serem especiais está no quanto elas têm efeito sobre minha vida, meus sentimentos, ações e vontades. Cristo , como personagem isolado é apenas mais um vulto histórico, um profeta incrível e até um Deus poderoso, mas... e daí? Eu posso o admirar e estar alheia a ele, tanto quanto a Maomé. Mas Cristo em mim, isso sim, é algo de que realmente eu m e maravilho! Porque juntos, partilhando problemas e alegrias, dividindo vitórias e derrotas ou simplesmente vivendo a paz e a alegria de estarmos juntinhos um ao lado do outro, isso é assombrosamente bom. Ele então nem precisaria ser um afamado personagem, um filósofo e político fenomenal, nem um Deus capaz demover montanhas e acalmar tempestades; eu o amo porque Sua influência na minha vida é fundamental para eu ser feliz. Todos os grandes personagens bíblicos não foram grandes porque achavam Deus o máximo, mas porque a Sua relação com Esse Deus era o máximo. Houve há certo tempo um homem que admirou muito a Jesus. Ele o viu pela primeira vez enquanto Cristo pregava às multidões e ficou maravilhado com Seu carisma, Seu poder, Seu olhar penetrante, a forma como curava, a sabedoria que emanava em jorros do Mestre. Este homem foi chamado do meio da multidão para acompanhar Cristo de perto por três anos. Estou certa que durante este tempo, ele aprendeu a admirá-lO mais. E depois de andar, comer, conversar, receber carinho e ter tido amor como jamais ninguém o amou, este homem ainda não permitira que Jesus penetrasse no seu coração e na sua vida de forma plena, e não investiu na relação de amor que lhe estava proposta. Por isso, Judas não conseguiu que a sua relação com o Mestre se tornasse admirável, antes a fez infame com uma cruel traição. Amor de verdade só vem quando a pessoa a quem admiramos forma uma dupla admirável conosco. E se você deixar Jesus ser Seu parceiro, o mundo admirará a Ele em você! Que este seja nosso testemunho até o dia da glorificação.
Uma semana Feliz e Iluminada!

Lux Lunae

domingo, 9 de julho de 2000

Passando uma chuva

"Porque somos estrangeiros diante de ti, e peregrinos como todos os nossos pais; como a sombra são os nossos dias sobre a terra, e sem ti não há esperança." I Cr 29:15

Esta semana cheguei a uma conclusão que precisei anotar para a posteridade: você só saberá o valor exato do seu lar quando, longe dele, ficar muito doente. Embora um tanto dramática, esta é uma verdade que descobri curtindo 41,5º C de febre em cima de uma cama, tendo a gripe por companhia e a tosse por som mais próximo do humano. Bem, pelo intróito desta mensagem você vê que eu fiquei deprimida mesmo, e quem mais poderia me socorrer com o condão do ânimo e do amor? Ela! A super mamãe!
Dona Lindalva, que não podia fazer nada além de me recomendar duas dúzias de remédios naturais, alopáticos e trocentas dezenas de recomendações, fez de suas palavras, mais uma vez, o antídoto ideal para eu me sentir muito bem. Oradora perfeita que é, começou falando da sua preocupação com a gripe porque lá em Natal tem chovido torrrencialmente há vários dias, e arrematou o início do sermão afirmando: "Embora eu saiba que a situação do clima aí seja a inversa, não esqueça que você está apenas passando um chuva por aí, mas enquanto ela passa, olhe ao redor e faça alguma coisa!" E então começou a contar a história de um certo senhor chamado Paulo, hoje muito idoso, pai de um amigo católico nosso que é coordenador do grupo que ela frequenta.
Este senhor , há muitos anos atrás, veio até SP com um amigo, provavelmente movido pela falta de opções empregatícias por lá. Assim que chegaram aqui, desceram do pau-de-arara debaixo de uma chuva muito forte. Eles não tinham para onde ir, então só lhes restava correr para o abrigo mais próximo, tentando equilibrar no meio da enxurrada, os corpos franzinos carregados de sacolas. Como todo nordestino de primeira viagem em SP, eles logo descobriram que suas roupas não eram suficientes para vencer o frio, e o único lugar ao abrigo do vento forte era a frente de uma casa onde estava sentada uma jovem senhora. Eles se aproximaram respeitosamente, e seo Paulo indagou àquela senhora que, mais de perto ele percebera estar grávida, se poderia ficar ali embaixo com o amigo até a chuva passar. Ela os olhou desconfiada e calculou que talvez demorasse até aquele temporal cessar, mas consentiu gentilmente e ainda lhes ofereceu um café. O ronco da barriga de seo Paulo respondeu alegremente ao convite enquanto ele, envergonhado, falou que aceitaria pois há dois dias não comia nada. A mulher entrou vagarosamente, segurando a imensa barriga e dentro em pouco trouxe pão e café para os dois homens que não cabiam em si de satisfação. Depois sentou novamente e só então seo Paulo reparou que ao lado dela havia um grande machado e uma pilha enorme de troncos de lenha para cortar. Incontinenti, ele perguntou se poderia cortar a lenha enquanto esperava a chuva passar e ela disse que ficaria muito grata pois seu marido estava viajando e ela não tinha mais nenhum graveto para se aquecer, e o carvão do fogão já estava quase todo virado em cinzas. Os moços arregaçaram as mangas e cortaram toda a pilha de lenha. Enquanto a chuva passava, eles também consertaram a cerca da varanda, as goteiras do telhado, os degraus da escada e arrumaram e limparam toda a frente da casa da mulher. Quando garoava e o sol já começava a aparecer por trás das nuvens, eles foram se despedir, mas a mulher insistiu para que eles esperassem até o seu marido chegar, e embora encabulados e um tanto temerosos, o cheiro de galinha assada para o jantar os convenceu a ficar um pouco mais.
Em pouco tempo o marido dela chegou e reparou imediatamente que as coisas estavam diferentes. A mulher , respondendo ao seu olhar indagador, falou dos dois homens "do norte" que a ajudaram com as coisas e pediu que ele os recompessasse de alguma forma. Seo Paulo quis ir embora dizendo que eles haviam feito tudo sem querer retribuição, mas o marido daquela senhora arranjou lugar, comida, emprego e roupas para eles, que ficaram em SP por mais um ano como empregados de confiança daquele homem, com total apoio e estrutura. O marido da mulher a quem ajudaram enquanto a chuva passava , era o vice-prefeito de uma cidade do interior de SP.
Com uma voz branda e penetrante, minha mãe fez a aplicação da história: "Sei que quando vem a chuva a vontade que dá é se esconder embaixo do cobertor e ficar olhando ela cair através dos vidros da janela, mas lembre-se que não é só a chuva que está de passagem, você também está! E todo tempo é precioso no lugar em que você está; aproveite-o, olhe ao redor, descubra o que tem de ser feito e faça bem-feito, não deixe que o frio ou a incerteza quanto ao clima te desanimem. Apenas faça o seu melhor e quando a chuva passar, todos vão Ter o sol e você ainda terá uma recompensa.
Todos sabemos que espiritualmente estamos na Terra passando uma chuva. O vento castiga, o frio incomoda, os pés doem e sofremos com a ânsia de encontrarmos descanso. Jesus nos oferece abrigo em Sua Palavra e Amor através do teto da Igreja, onde podemos ficar como peregrinos que se protegem das intempéries. Mas se olharmos ao redor veremos que há muito para ser feito, e que afinal, nossa tarefa é de reparadores de brechas e restauradores de veredas; enquanto a chuva passa precisamos arregaçar as mangas e fazer o que deve ser feito da melhor forma possível. E quando o temporal se for, virá o Sol da Justiça, que todo olho verá, mas que dará a recompensa ao justo que labutou enquanto O esperava.
Uma semana feliz e iluminada!!

Lux Lunae

domingo, 2 de julho de 2000

De Mal Com Deus

"Jesus, porém, disse: Deixai vir a mim os pequeninos, porque deles é o reino dos céus" Mateus 19:14

Sempre detestei despedidas por serem aquelas ocasiões em que nunca se sabe ao certo o que falar ou fazer. Mas a que mais me marcou em sua tristeza foi quando fui me despedir de uma prima minha de oito anos, pouco antes de eu vir para São Paulo.
Nossa admiração mútua sempre foi muito forte, e, enquanto ela projetou em mim o modelo da "gente grande" que ela quer ser, eu me orgulho da intrepidez e coragem com que ela defende seus sonhos e opiniões. Não estou bem certa do que ela vê em mim que a faça se sentir movida a me imitar, mas meu especial amor por ela cresceu do fato dela ter muito do que eu queria ser e já não consigo.
Assim, ela diz para todos que quer ter um quarto bagunçado da mesma maneira que o meu (!) e eu me declaro fã de sua impetuosidade com as palavras. Ela me pedia para que eu a ensinasse a usar a internet para que ela também passasse o domingo inteiro na frente do computador e eu suspiro querendo aprender como ela faz parecer tão fácil defender a justiça sem o menor medo ou pudor. Eu a convenci a suportar os estudos que ela tanto detesta a fim de se tornar uma boa veterinária e ela, sem saber, sempre me dava uma tremenda ajuda emocional e espiritual; eu contava meus problemas para ela e ela me dava uma análise clara e simples da situação.
Antes de eu vir ela insistiu muito para que eu ficasse e me ameaçou de todas as formas: desde entrar na minha mala até ficar de mal comigo. E como eu não cedi, ficou de mal mesmo, de modo que a última vez que vi seu rostinho, ele estava triste, choroso e com um bico "destamanho". O que fez aliviar o nó na garganta que eu fiquei diante desta visão foi a lembrança das vezes que eu mesma fiquei de mal com uma pessoa que eu amo muito: meu pai.
Eu era a "quebradeira oficial" de vasos, abajures louças, porcelanas, cristais, vidros e afins. Esta propensão para o desastre que me acompanha até hoje, me rendeu muitos castigos e, quando minha inquietude curiosa e desastrada ultrapassava todos os limites, meu pai providenciava "carões" e surras bem duros. Eu ficava com muita raiva e prometia a mim mesma que nunca mais falaria com ele, que estava de mal e lhe seria completamente indiferente, "pra ele ver o que é bom pra tosse". Acontece que o outro dia vinha e nós tínhamos por hábito recebe-lo todas as tardes ao portão, correndo e abraçando-o com força, e aí, tudo era folia e brincadeira até a hora do jantar. E nessas horas eu sempre esquecia que estava de mal com ele e corria com a mesma euforia em sua direção. Às vezes até lembrava, mas já estava abraçando-o, e então não adiantava mais... "Ah, mas ele é tão bom! Vou dar mais esta chance pra ele", eu pensava. E no máximo fazia um biquinho para ganhar mais dengo...
Depois de algum tempo, percebi que as crianças tem essa tendência natural para o perdão, porque elas não gostam de perder tempo com coisas tristes, e a sua lógica é que vale a pena deixar o amor prevalecer, mesmo que ela não consiga entender porque não pode fazer tudo que quer e ter tudo o que deseja. Acho bem provável que este seja um dos grandes motivos por que vale a pena ser uma criança espiritualmente. Depois de fazer minhas traquinagens, eu, por vezes, me aborreci por Deus permitir que eu sofresse as conseqüências delas, sem falar naquela birra infantil que nos leva a pensar que "se Deus me ama mesmo Ele bem que poderia me deixar fazer tudo o que quero sem pegar no meu pé depois". Então ficava de mal e me fechava para qualquer trégua. Mas sabem de uma coisa? É impossível ver um Deus sorrindo de braços abertos para mim logo depois de eu ter aprontado com Ele e continuar fazendo tipo. O melhor é reconhecer que eu errei e Ele tem sempre razão. O melhor, com certeza, é correr rapidinho para a paz reconfortante de Seus braços e aproveitar a alegria de ter um Pai assim tão bom.
Se você está em dúvida porque já esqueceu como é ser criança (cuidado: o primeiro sinal de que se está velho é esquecer as coisas; o segundo é...... não lembro!), vai por mim: dá uma chance pra Ele. E nem precisa fazer biquinho, porque Ele vai te amar com toda força de um Deus que é Amor. Basta que você se permita correr agora em Sua direção.
Ah! Recebi um pequeno cartão da minha prima esta semana. Ele diz assim: "Luciana, Quero te dizer que estou com saudade e queria lhe dar um abraço bem forte. Por último queria lhe dizer que te amo muito e também queria dizer que volte logo!"
Uma Semana Feliz e Iluminada

Lux Lunae