domingo, 25 de junho de 2000

Mais uma Definição de Amor

“Em Gibeão apareceu o Senhor a Salomão de noite em sonhos, e disse-lhe: Pede o que queres que eu te dê.” I Reis 3: 5

Amar é realizar sonhos.
E, muito embora eu concorde com o Machado de Assis quando ele diz que todas as definições de amor não valem um beijo, acho que esta em particular me tem um significado especial, por ser a conclusão de uma história não menos especial, contada pela minha avó. Acho inconcebível almoçar na casa da avó (minha ou de quem quer que seja) e não degustar como sobremesa uma boa história (às vezes com ares de estória), daquelas bem antigas, contadas de uma maneira... entre solene e misteriosa. Numa dessas oportunidades, na casa de minha avó Cecília, ouvi-a contar do seu casamento com meu avô Enéas (- "Deus o tenha", ela diria).
Meu avô tinha um espírito aventureiro, que o impedia de se fixar em qualquer lugar ou situação, sempre a buscar novos desafios, e não media esforços para atingir suas metas, mesmo tendo de enfrentar as mais ferinas oposições. Foi lavrador e comerciante, chegou a ser considerado um homem de posses, com uma vida estável e bem sucedida, mas parecia aborrecer incomensuravelmente a rotina, pois deixava tudo para trás e ia tentar algo diferente e novo em outro lugar. Minha avó sempre o acompanhou, junto com os 13 filhos (se não me falha a memória). Ela não dispunha do mesmo espírito aventureiro. Antes, tudo o que queria era que seu marido se aquietasse e tratasse de criar os filhos com ela, sossegadamente. Murmurava, reclamava, ameaçava, mas acabava sempre cedendo às empreitadas "destemperadas" do meu avô. Passou privações ao lado dele, chegou a dormir com a ninhada de filhos debaixo de uma árvore, morou em casa de taipa, passou fome e teve que esquecer muitos caprichos típicos de mulher. Minha mãe conta que o cardápio, em muitas épocas, a fazia saborear feijão branco cozido no sal, com um peixinho chamado traíra todos os dias e barro na sobremesa. Minha avó só viu "seo" Enéas se aquietar quando um câncer no pulmão o fez descansar, depois de uma longa história de vitórias e derrotas que deixaram um caráter lutador na minha família materna (aguçado pela herança genética, que faz "certas parentas" serem identificadas como "clones" dele).
Pensei no meu avô enquanto estou sentada numa praça que não sei o nome, em frente a uma escultura no mínimo bizarra, perto da Av. Nove de Julho. Lembrei que ele também teve o sonho de vir a São Paulo e essa foi a maior prova de amor que minha avó lhe deu; para permitir que ele realizasse mais esse sonho, suportou um ano de ausência do seu amado, e ainda teve de encontrar forças na solidão para crias os filhos, administrar os gastos e agüentar comentários maldosos. Parei para pensar em quantas pessoas me apoiaram para que eu também pudesse estar aqui, tentando decifrar essa escultura paulista e lutando por novos ideais. Algumas em especial se dispuseram a abnegar o que fosse preciso em prol do meu sonho , sem obter ressarcimento. Intrigada com esta capacidade de se dar para realizar sonhos, recorro mais uma vez à minha avó, lembrando da sua expressão de felicidade ao chegar no fim da história. E a explicação me vem numa frase musical: "Sonho que se sonha só é só um sonho que se sonha só, mas sonho que se sonha junto é realidade."
Somente o amor é capaz de tornar os sonhos reais, e quando esse amor é fruto de uma parceria, o sonho também se torna conjunto, a felicidade de o realizar é partilhada na mesma intensidade. Os objetivos, assim como as vidas, se fundem, e correm na mesma direção, sendo que o amor é a energia que faz as coisas acontecerem, que faz as abnegações não fazerem a menor falta, que faz os sacrifícios possíveis e até mesmo a dor ser encoberta pela felicidade de ver o sonho do outro acontecendo.
Penso agora em um Deus Pai com um grande sonho: criar uma humanidade para viver eternamente, plena de felicidade e paz. Imagino-o partilhando Seu sonho com o Filho e o Espírito Santo que, por possuírem o Amor Perfeito, formam a Unidade Perfeita, e consigo vislumbrar o gozo em criarem a projetarem tudo para que esse sonho acontecesse. Agora posso imaginar o pesar que tomou o coração do Pai quando o pecado ameaçou destruir Seu sonho, e a esperança que encheu o céu, quando Jesus, disposto a realizar o sonho do Pai - sonho Seu também, devido ao vínculo de amor - decidiu tornar-se homem de dores, ser maltratado e rejeitado na terra e morrer, abnegando Sua divindade e toda a honra e glória que Lhe são devidas.
Não é preciso muito esforço para lembrar de todos os sonhos que Jesus realizou para mim. E aqueles que eu não realizei foram os mesmos que eu sonhei só, "sonhos que se sonha só", mas todos que eu entrei em parceria com Ele e dividi, e partilhei, sem exceção, tornaram-se reais, como todo "sonho que se sonha junto".
Se você ainda não experimentou essa parceria, tente! Se você já sentiu o quanto ela é poderosa, faça como eu, reafirme hoje o desejo de estar sempre ao lado de Cristo, aquele que tem amor tão grande que é capaz de realizar todos os sonhos. Ah, e sonhe grande, bem alto mesmo, sem medo, pois estamos falando do Rei dos Reis e Deus Todo-Poderoso. Una seus ideais aos de Cristo, deixando que Ele dirija ao acontecimentos, e depois me fale se você conseguiu o que queria... A promessa é certa: "Pedi e dar-se-vos-á."
Estou certa que na Nova Jerusalém, onde o sonho de Deus vai ser uma realidade partilhada por todos os que O amam, nós teremos muitos almoços na casa dos meus avós, recheadas de histórias de amor: deles, minhas e suas.
Uma Semana Feliz e Iluminada!!

Lux Lunae

domingo, 18 de junho de 2000

Lembrando com pedras brancas

“Guarda-te para que não te esqueças do Senhor teu Deus... antes te lembrarás do Senhor teu Deu , que é Ele que te dá força para adquirires poder; para confirmar o Seu concerto, que jurou a teus pais ; como se vê neste dia” Deuteronômio 8: 11 e 18

Semana passada tive o prazer de degustar um gostoso e nutritivo almoço na casa da nossa amiga geana Pilocarpina, e logo após a refeição me deparei surpresa com algumas fotografias que a mãe dela tirou há uns quatro anos quando esteve a passeio em Natal. Cada paisagem que eu via me remetia às mais profundas lembranças, cada lugar que eu identificava era uma voz doce me contando a minha própria história. Uma das fotografias mostrava a praia de Areia Preta (cuja areia não é preta; certamente quem deu este nome ainda não havia visitado Santos) e num cantinho, o velho ponto de ônibus junto à casa em ruínas. Meu coração apertou mais forte diante deste quadro e todas as lembranças que ele me trouxe. Este ponto de ônibus era o último, portanto o mais afastado e o mais próximo à parte mais isolada e bonita da praia. À direita ficavam as ruínas de uma velha casa, e seu alicerce nos olhava com ares de imponência, como uma altiva senhora idosa cujo olhar soberbo é o último sinal de grandeza, negado pelo decrépito corpo. O alicerce terminava bem em frente a rochas escuras e pontiagudas onde as ondas vinham quebrar furiosamente. Ali, no cantinho do alicerce, olhando o mar bravio, duas mentes não menos bravias se encontravam às tardes num namoro filosófico. Hehehe, foi o termo mais próximo que eu encontrei para adjetivar meus encontros com Roberto. Eu tinha treze anos, ele, vinte e oito, mas estávamos unidos por uma criticidade aguda e por uma mania incurável de buscar o porquê a solução das coisas. É certo que chegávamos a bem poucas conclusões, mas divagávamos sobre todas as facetas da natureza humana, da sociedade, do sistema vigente. Eu estava acabando de descobrir o mundo ao meu redor , e tinha uma fome indevassável de estudar e entender. Assim, tudo era matéria-prima para nossas mentes artesãs; o homem era dissecado em nossas análises tão amadoras mas que julgávamos a verdadeira pedra filosofal. Lembrei do dia em que terminamos o namoro ( o mesmo dia em que decidi me batizar da IASD) e ele me deu uma pedrinha branca, cuja função, segundo ele, era ser o nosso memorial. E aí filosofamos pela última vez a respeito da memória. Ele me falou que ao olhar aquela pedra eu não deveria usar apenas minha memória passiva e lembrar de fatos isolados, como que abrindo um arquivo no computador, mas usar minha memória afetiva e asociar cada fato desse a um sentimento significativo, reviver cada lembrança não como parte do passado, mas com a certeza de um sentimento presente e por ser eterno (segudno ele), projetando-o e celebrando-o para o futuro. Depois desse dia aprendi a guardar pequenos memoriais de cada fato importante da minha vida, assim, consigo reviver o sentimento marcante com exatidão, apenas fechando os olhos e tocando uma flor seca, um guardanapo, um chaveiro, uma pedra, um limão, uma escova de dentes...
Ao nos criar, Deus sabia que certas experiências deixam marcas incisivas em nossa psique, marcas que são reativadas com o sentimento correspondente quando nos colocamos diante de algo que simbolize ou faça analogia a elas. Por isso providenciou para Seu povo uma série de memoriais que servissem de aliança entre Ele e os Seus. O pecado corrompeu também nossa memória, de modo que somente uma memória convertida é capaz de fazer lembrança das bênçãos de Deus como parte do presente e do futuro, celebrando-as como marcas indissolúveis de um amor infinito. Sabendo o quanto somos propensos a esquecer Suas dádivas e o significado delas em nossa vida, Deus utiliza com frequência o termo: “Lembra-te...”.
O povo hebreu é o maior exemplo disso. O hebreu cria e firmava sua fé não pela força d complexos argumentos racionais ou provas teológicas doutrinárias; sua convicção vinha da experiência com deus, a vivência das bênçãos divinas celebrada sempre e passada de geração à geração. “Lembra-te de todo caminho que o Senhor teu Deus te fez percorrer durante quarenta anos no deserto”. Dt 8:2. E o hebreu não apenas recordava, mas “fazia memória” de sua experiência, tornando os fatos objeto de culto e louvor, tornando-os parte do presente e certeza para o futuro, renovando o eventos no tempo , no significado e na eficácia. E o hebreu acreditava, porque seus olhos viram (Dt. 11:3 - 7), porque seus pais lhe contaram (Dt. 32:7), porque sua experiência com Deus era mais que lembrança passiva; era fonte de nova e constante bênção ( Dt 8). E a fé do hebreu crescia de forma extraordinária; uma fé simples mas eficaz cujo segredo de ser inabalável estava em ser uma fé pessoal , não teórica, mas “solidamente ancorada na vida, capaz de dar a Deus um nome e traços a ao Seu semblante”.
Nossa fé perde a força quando deixamos de fazer memória da nossa história com Deus, quando não damos o significado verdadeiro às grandes e pequenas alianças que Ele fez conosco. Percebi isso certo dia quando uma amiga minha me procurou angustiada, dizendo-se não estar mais apaixonada pelo seu marido, e por causa disso estava vendo a aliança do casamento se quebrar. Isto é um exemplo comum de memória enferma, que não lembra ou lembra apenas parcialmente dos fatos que conduziram à aliança, não interpreta o que recorda, não ama nem contempla as lembranças das provas de que o amor existe e está bem mais próximo que se imagina. Falei isso a ela e pedi que ela lembrasse de todas as qualidades do marido que a fizeram se apaixonar por ele, que as listasse num papel e que as lesse todos os dias , se esforçando por achar novas qualidades cada vez que as lesse. Que orasse agradecendo a Deus pelas qualidades do seu marido e todas as boas lembranças que ele lhe proporcionou, louvando ao Pai pelo homem que ela escolheu para ser seu companheiro. Faz algum tempo que perdi o contato com ela, mas da última vez que tive notícias dela eu mesma louvei a Deus por um caso a menos de adultério da Igreja.
Crescer na fé significa cada dia fazer memória da benevolência divina. Deus sabe tanto dessa nossa necessidade espiritual que nos deu um dia inteiro como memorial da criação e redenção, para ser dedicado exclusivamente à contemplação de Sua divindade. A escritora Ellen White, baseada em sua própria experiência espiritual, aconselha em um de seus escritos a reservarmos pelo menos uma hora diária para o exercício da contemplação do amor de Deus revelado por Sua Palavra. E também afirma com a convicção de uma fé pessoal , que “nada temos a temer quanto ao futuro a menos que nos esqueçamos o modo como Deus nos guiou no passado”. Isso é converter nossa memória a Deus. E quanto mais o tempo passar , mais seremos capazes de lembrar tudo , guardar na mente e coração tudo o que os nosso olhos viram e os ouvidos ouviram. A memória afetiva que carregamos conosco nos fará capazes de enfrentar qualquer circunstância da vida confiando que nosso Deus é Pai e Senhor, e ainda que o mundo nos rejeite, Ele será conosco.
Um dia, ao lado de Cristo no céu, nossas lembranças já não serão objeto de celebração, mas apenas peças de um quebra-cabeças que se revelará perfeitamente, e nós mesmo alcançaremos a memória restaurada com a qual uma vez fomos criados. Entenderemos então a dimensão da memória de um Deus que nos tem gravados nas palmas das mãos.
Hoje já não tenho a pedrinha branca que Roberto me deu, ainda que guarde a lembrança dele com carinho. Mas guardo comigo a fé em um Deus que nos prometeu por memorial de nossa vitória: “Ao que vencer... dar-lhe-ei uma pedra branca, e na pedra um novo nome escrito” (Apoc. 2:17), para levarmos conosco para sempre esta aliança de Seu amor eterno.
Uma semana feliz e iluminada!

Lux Lunae

domingo, 11 de junho de 2000

Olhos de pomba : uma meditação romântica e democrática

“Como és formosa, querida minha, como és formosa! Os teus olhos são como os das pombas...” Cantares 4:1

Por toda parte, corações, cupidos, rosas, propagandas em graúdas letras vermelhas falando de amor e de quanto custa mantê-lo... um clima cor-de-rosa paira por sobre a nuvem cinza que envolve São Paulo, não menos rosa em todas as demais cidades brasileiras menos cinza. É dia dos namorados e esta é uma daquelas ocasiões em que, quem está de fora, se sente mais por fora que nunca. Cada singelo coraçãozinho vermelho pode ser uma afronta aos sinceros sentimentos dos solteiros, descomprometidos e afins... ontem mesmo, já um tanto melancólica de tanto ouvir falar em “jantar dos namorados” patrocinados pelas igrejas, sugeri a uma amiga que se devia fazer paralelamente , a “festa do casaquinho”, para que essas desconsoladas almas abandonadas, ou não tão abençoadas, tivessem alguns momentos descontraídos, partilhando a tragédia grega da solidão com outros pouco agraciados que não têm nada mais que um casaco para se aquecer...:-)))
Mas como esta idéia ainda não é realidade, entremos também no clima da diáfana nuvem cor-de-rosa. Para tanto, nada melhor que começar pelo Cântico dos cânticos, que ainda é o mais belo hino de exaltação ao amor, embora perca cada vez mais atenção para a sua concorrente, a filosofia do Quântico dos quânticos, aquela que quantifica e racionaliza o amor entre os seres humanos, criando relacionamentos matematicamente quase perfeitos, não fosse o simples detalhe que, no amor um mais um nunca pode ser dois.
O versículo acima mencionado me chamou atenção por um detalhe biológico da analogia de Salomão. Ele comparou os olhos da sua amada aos olhos da pomba, e considerando que há na natureza outros olhos mais belos a que ele pudesse fazer referência, achei que poderia haver um significado mais profundo para a escolha justamente da pomba. Descobri depois de uma pequena pesquisa oftalmológica, que os olhos das pombas são unifocais, ou seja, têm a característica peculiar de olhar apenas um objeto de cada vez. Assim, ao contrário de nós que conseguimos focalizar várias pessoas enquanto passeamos abraçados carinhosamente a nossas bolsas pela praça da Sé, aquelas pombinhas que por lá trafegam só conseguem ver uma pessoa de cada vez.
Creio que neste sentido surge uma análise interessante sobre a amada de Salomão: tal como as pombas, ela teria olhos só para ele, e por ter escolhido repousar o olhar sobre seu amado, nenhum outro objeto ou pessoa teriam lugar no seu ângulo de visão. A romântica e sábia Sulamita tinha olhos de pomba porque era completamente fiel àquele nobre rapaz que apascentava entre os lírios, e tal qual o Deus a quem serviam, sua fidelidade era aquela que dura para sempre.
Quando o verdadeiro amor toca a existência humana, ele invade todos os espaços (mesmo que lentamente) e provoca uma resposta não menos total: amor dado em sua totalidade e recebido abertamente em sua totalidade não responderá parcial, limitada ou condicionalmente, mas reagirá por completo, quer em profundidade, quer no tempo. Há um filósofo chamado Raguin que escreveu: “somente o que é perpétuo pode manifestar uma profundidade íntima”, e ainda que hajam disparidades, problemas, ruídos de comunicação, e até mesmo distância e imperfeições adquiridas pela vida afora, o ser humano que ama se empenha para sempre. Se não investe num relacionamento para a eternidade, ele apenas se empresta e não permitirá que seu amor passe da adolescência. Chegar ao amor maduro não é apenas ter capacidade de se apaixonar, mas de permanecer no amor uma vez focalizado, deixá-lo crescer sem acrescentar frustrações, e isso implica numa consciência quanto às exigências desse amor; a capacidade de manifestá-lo, identificando as motivações para fazê-lo; responder equivalentemente a intensidade do afeto; apreender cada nova nuance na experiência de estar sendo amado até fazer desse amor o parâmetros de nossas atitudes e pensamentos, sem que para isso tenhamos deixado de ser nós mesmos, antes, tenhamos nos encontrado ainda mais, nos descoberto de forma mais completa. Neste estágio alcançaremos a fidelidade eterna. Chegou-se ao ponto em que o amor basta em si mesmo, o intelecto e a vontade se converteram ao amor; o primeiro reconhecendo o valor dele, a segunda, por seu caráter unifocal, dizendo não a todos os demais amores (principalmente aos próprios).
Tal como o livro do Cânticos dos cânticos, esta análise deve ser aplicada ao nosso relacionamento com Deus. Um coração convertido a Deus, será um coração apaixonado, que responde por inteiro ao amor supremo, terá uma vontade firme como torre (tal qual os seios da Sulamita, tipo da Igreja de Cristo) e uma mente criativa, inteiramente harmonizada com o Pai e crescendo em todos os níveis do seu ser, em direção a Ele. Interessante perceber que o amor em Deus só se perfaz quando entregamos a Ele fielmente, justamente aquilo que mais gostaríamos de ter somente para nós: o coração, a mente e a vontade.
Claro que este processo não se faz sem dificuldade... é um caminho longo, pedregoso e por vezes não espontâneo, sujeito a quedas , incertezas, saudades dos antigos amores, mas em tudo isso , se houver sinceridade conosco mesmos, haverá vitória, pois identificaremos os ídolos que nos separam ainda de Deus e com a ajuda do Espírito Santo, destruiremos passo a passo, um a um os seus altares, sempre fiéis ao amor que uma vez conhecemos. Deus por sua vez não é o deus do Quântico dos quânticos, e não precisa de fé em quantidade, mas em qualidade; Ele fez nosso coração, sabe do que é feito, e mede nosso amor e fidelidade com sua própria medida, que está longe de qualquer parâmetro humano e tem por fundamento Seu próprio amor e nossa entrega (leia-se, capacidade de recebê-lO).
Prosseguir em direção a esse amor, ser fiel a ele, investir nele sabendo que a qualquer tempo estaremos sendo correspondidos: isso é encontrar Cristo. E apaixonar-se por ele, como bem o descobriram os que já se apaixonaram de verdade, é às vezes chama ardente, desejo flamejante, às vezes brasa que se mantém acesa não obstante a chuva do pesar, ou ainda a nostalgia profunda de descobrir um amor intenso sem poder possui-lo totalmente de pronto...
Namorados ou descomprometidos: que neste dia cor-de-rosa - e em outros azuis ou acinzentados - o Senhor de todo amor possa nos olhar apaixonadamente e comparar nossos olhos aos da pomba.
Uma semana feliz, iluminada e cheia de amor pra dar!

Lux Lunae

domingo, 4 de junho de 2000

Andando com ela por luz e trevas

“Vós porém sois raça eleita, sacerdócio real, nação santa, povo de propriedade exclusiva de Deus. A fim de proclamardes as virtudes daquele que vos chamou das trevas para a sua maravilhosa luz.” I Pe. 2: 9

Ela caminhava tranquila por aquela estrada.
De vez em quando parava fechando os olhos, para sentir melhor o frescor matinal ou olhar mais de perto uma flor nova ou um animal curioso que tornavam ainda mais agradável a sua jornada. Pessoas com semblantes iluminados passavam por ela e a maioria a saudava com um sorriso caloroso... algumas pareciam tristes, outras cansadas, mas estavam juntas, na mesma direção, com o mesmo semblante brilhante, não raro abraçados uns nos outros
Passando por uma gruta, ela ouve vozes estranhas vindas lá de dentro e se sente estranhamente atraída a se aproximar. Enquanto ela adentra a caverna, sente uma sensação indescritível de poder: se sente capaz de explorar o desconhecido e pode , sozinha, e munida com sua auto-suficiência, assimilar esta nova e atrativa paisagem, se dando conta de como é prazerosa a segurança de descobrir os próprios limites. Nem repara que passada a belíssima entrada da caverna, o ambiente vai ficando mais e mais sombrio. Quando se dá conta, já está completamente envolvida... a luz atrás de si continua a chamar numa penumbra mais e mais fraca a cada passo que ela dá em direção contrária, e as vozes hipnóticas que a chamam ficam cada vez mais intensas... ela sente seus sentidos confundidos, ate descobrir, desolada, que no meio das trevas palpáveis já não há como discernir cores, nem ver sorrisos ou apreciar o que é belo; nem mesmo o certo e o errado ou a direção a seguir podem ser discernidas com clareza. O cansaço vem, mas não se pode confiar nos abraços dos corpos que perambulam por ali, desesperados, desiludidos ou eufóricos na própria degradação. Corpos cujos rostos estão encobertos pela negritude, e que já não buscam sentimentos, mas apenas sensações, não mais amor, mas apenas alívio ou um momento de distração da própria dor.
Há uma saída, ela sente isso, mas também sabe que esta saída fica cada vez mais distante enquanto seus pés sangram no solo áspero e seu corpo sofre rente às paredes de rochas frias e agudas. A esperança agora é que as imagens do que foi visto sob a luz daquele caminho uma vez abandonado, alimentem o desejo de voltar até que venha uma mão forte e poderosa que lhe guie
Erramos diariamente por driblar a consciência, por tapar os olhos à luz da chama do Espírito Santo. É triste ver que os homens valorosos como os reformadores, lutaram com a vida para que tenhamos direito ao livre uso da consciência e ela hoje em dia seja tão pouco usada. Que tenham lutado tanto e tão corajosamente para termos a Bíblia em nossas mãos e nós a leiamos tão pouco, preferindo muitas vezes as hipnóticas vozes da escuridão que a voz mansa e suave da Palavra de Deus.
"Consola-te" exclamou Latimer a seu companheiro de martírio, quando as chamas estavam a ponto de fazer silenciar-lhes a voz; "acenderemos neste dia na Inglaterra uma luz que, pela graça de Deus, espero, jamais se apagará." (O Grande Conflito pág. 247). E no entanto a pergunta do mártir Tyndale, ainda que usada em outro contexto até oposto, continua ainda válida: "Deve a igreja ter menos luz ao meio-dia do que à aurora?" Naquele tempo os homens, apesar de terem pouca luz como fora determinado para seu tempo, ERAM luz, a ponto de flamejarem como tochas vivas! Hoje, cada profecia cumprida é um holofote sobre o mundo, e estudando a Palavra de Deus nos damos conta de quanta luz nos foi revelada e emana em feixes densos sobre aqueles que não se escondem na gruta do próprio eu, na caverna do Príncipe deste mundo... mas insistimos em ser velas. Velas que apagam ao soprar um vento mais forte. Precisamos ser fogueiras, que, quanto mais forte sopre o vento, tanto maior seja a chama a arder.
A caverna escura onde se adentra em busca de uma falsa segurança, e de novas paisagens sobre as quais os sentidos não têm força (ainda que só depois se descubra isso) será a mesma que estará sobre os que dirão "caí sobre nós" quando for manifesta a luz do rosto que todo olho verá.
Hoje é o tempo de andarmos na luz para a qual uma vez fomos chamados. Prosseguir no caminho e refletir a luz que incide sobre nós.

Uma semana feliz e muitíssimo iluminada!!

Lux Lunae